sábado, 20 de agosto de 2011

O meu "você"; O seu "eu"

De todos os olhares, é daquele que jamais tive que sentirei falta. O último, o fantasiado, aquele que ninguém – ou nada – que não fosse a minha própria imaginação poderia ter conferido a consistência e força perfeita. O brilho adequado… cada fechar e abrir de pálpebra no momento exato. Isto porque foi imaginado, desejado, idealizado, como na verdade todo o resto. Manias, manias de idealizar o que se deseja e se esquecer de que o real passa longe disso.

O olhar é importante, porque é uma parte representativa essencial de todo o ser. “Olhos são as janelas da alma”, afinal. E, portanto, sinto que novamente vacilei em minha idealização.

Não estou exatamente me culpando. Todos idealizam e ninguém é realmente visto como é. Eu não sou o que as pessoas vêem, e cada uma vê um “eu” diferente, que é ainda mais estranho que o original. Na realidade, se somarmos como cada um vê ao outro, o mundo teria uma superpopulação que certamente não seriam reconhecidos pelo “eu” original.

É importante ter a sua personalidade, a sua maneira única de pensar, as suas idéias e ideais. Mas isso não muda a coisa toda. Você ainda será visto de maneira errada, com características que as pessoas desejam atribuir a você, porque essa é a válvula de escape que toda a humanidade tem para que sejamos agradáveis uns aos olhos dos outros: fantasiar.

Eu não sou o que você pensa. Você está longe de ser o que eu penso. E mesmo assim o mundo continua girando e, veja bem, é esse o motivo de eu gostar de você e você de mim. Só precisamos ter um pouco de cuidado com os exageros, ou as frases “você me decepcionou” ou “Eu estava errado sobre você” machucarão – por mais verdadeiras que possam ser – a pessoa errada nos momentos finais. Principalmente porque a maior culpa (me contradigo aqui ao dizer que não estava me culpando alguns parágrafos acima?) é do idealizador. O objeto idealizado não tem a menor culpa de ser idealizado.

O que ela é está ali, claro, mesmo que ela tente se camuflar sob os panos de idealização que teceram para ela, e são apenas os nossos olhos – janelas embaçadas, neste caso – que não querem vê-la como é.


I had a vision I could turn you right
A stupid mission in a lethal fight
I should have seen it when my hope was new

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Alarde

Que tem de doce a vida quando em mim explode?
Um chumaço do frasco da minha ferida
A cada dia morre como incandescência
E como cala o dia quando precipita...

O meu amor todo verso encomprida
A cada nova estrofe, de querer somente
O peito morde, e o calar da vida
Canta os veraneios de novo afluente.

E agora tola, e feliz tola ou muda
Muda dos versos que já não me descem
Ou das miúdas coisas tolas que semeio;

Porque o silêncio conta a coisa aguda
Dos que sentem tanto, e que se não fenecem,
Fazem da vida a agulha no febril palheiro.

terça-feira, 19 de julho de 2011

1, 2.. 10, 20 perdi a contas

Um dia talvez você entenda o quanto a sua distração me dói, o quanto esse seu silêncio me rasga. Eu desisto, aprendo a viver sozinha por questão de sobrevivência, eu me conformo, eu me rendo e dou a volta por cima, você vem e sorri. Perfeição é uma coisa que você nunca vai encontrar em mim eu não planejei nada disso, só aconteceu e eu acho realmente que tudo aconteceu do jeito que devia acontecer eu aprendi a dizer adeus. Duvido que você saiba exatamente o que está sentindo, o tempo corre e a gente vai descobrindo jeitos de se proteger, minhas orações mudaram e eu não peço por cargas mais leves e sim por ombros mais fortes, eu posso cair, mas não vou ficar no chão e se houvesse um jeito de voltar atras? Nunca seguiríamos em frente é sempre assim, as coisas passam, ficam, mudam, a vida tem o costume de voltar as vezes e nessas voltas eu já cansei de deixar ser sabendo que amanhã ou depois já é hora de ir. Talvez o segredo esteja ai. Não olhar pra trás, deixar as coisas seguirem seu percurso, não interferir em nada. Se você, mesmo que por um segundo, sentiu minha falta, por favor, diga, eu estou começando a duvidar de tudo a minha volta até mesmo de mim, talvez você se lembre de mim quando eu finalmente te esquecer. Se lembre de quantos dias eu te dei e você jogou fora, se lembre de todas as vezes que eu dizia te amar e você não me respondia, se lembre do quanto eu quis estar aqui e estive.

Não vale a pena viver sonhando e se esquecer de viver. Mas se eu parar quem vai ter história pra poder contar? Eu sei o final.. E é sempre igual

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Gotas de um chover qualquer.

Teus braços envolviam a fragilidade de meu corpo e circundavam nossas almas em um anoitecer. As gotas d’água absortas de um oceano, caiam sob nossas faces em quedas sutis. Meus olhos fechavam e abriam segundos depois, olhando os teus sorrirem. E sorriam tão bonito, sorriam como os de uma criança. Havia uma fortaleza resguardando nós, teus braços me protegiam do mal, do futuro incerto, das mentiras de outrora, teus braços em meus braços. Mas as gotas caiam forte e mesmo no mais singelo querer não podíamos ficar. Dançamos mais uma vez conforme nossos sonhos e deixamos mais gotas caírem em outrem. Mas tudo bem. Você me contaria histórias para dormir, inventaria castelos e dragões, bem aqueles que víamos nas nuvens, beijaria minha testa e me cobriria no inverno. Isso aconteceria se eu ainda fosse frágil, se você ainda estivesse aqui. Teus olhos distantes são agora incompreensíveis, não me dizem verdades, nem mentiras, não, não me dizem absolutamente nada. Braços, braços, não há mais braços. Há um pequeno rasgo entre aquilo que me fortalece. Tua boca é muda, muda da vida e de meus sonhos, de qualquer dito melancólico de insensatez. Não, não existem histórias… O dragão morreu? Pois não há nada, nada mais, nenhuma marca para contar a minha história. Nos divergimos em nosso próprio sangue. O mesmo sangue. Mas olhe, está chovendo lá fora… Não quer dançar novamente?

domingo, 5 de junho de 2011

Quiser

Uma salva de palmas, você conseguiu o que queria
Dê uma boa olhada no que você abandonou
Porque, veja só, não se pode desfazer um coração partido

E você consegue se lembrar de como eu a beijava?
Lembra-se do sabor doce em sua boca?
Pois, querida, tudo que lhe resta é a lembrança
Porque estou seguindo, seguindo, seguindo em frente

Tudo o que você quiser
Espero que você consiga tudo o que quiser
Porque eu consigo

Que cada manhã alegre você
E diga-me: você fica rindo sozinha até dormir?
Espero que você ache fácil me esquecer

Espero que você não sinta nada quando me ver
Fico imaginando se você está se divertindo por aí
Espero que você consiga tudo o que queria mesmo
Porque estou seguindo, seguindo, seguindo em frente

Você não vê que a luz mudou
E nada parece ser igual?
Apenas sombras no chão
E se você ouvir com atenção ouvirá o som

Tudo o que você quiser
Espero que você consiga tudo o que quiser
Porque eu consegui

via : Natalie Imbruglia (Want)

É claro – que tá tudo escuro.

Algo me diz que perdemos algo. Pode ser que não seja nada demais. Pode ser que seja a coisa mais importante do mundo. Não faz diferença.

A coisa mais importante do mundo, não é nada demais.

Você acha que o amor é tudo na vida e, de repente, vê que não sabe nadar.

É, você não sabe nadar. E se o avião cair no mar? O amor vai te salvar? Não, a natação vai te salvar. E se você escorregar na piscina? E se o barco afundar? E se um tsunami atingir a tua praia?

Eu tô nadando contra a corrente.

A: Bons amigos?

B: Mais do que amigos.

A: Menos do que amantes.

B: Menos drama.

A: Mais amor.

B: Mais paciência.

A: Menos indecisão.

B: Menos…

A: Menos?

B: Mais.

A: Agora?

B: Depois…

A: Depois vai ser diferente.

B: Se depois fosse óbvio, você não estaria aqui.

A: E se eu for embora?

B: Não seja tão óbvio.

via: Adiós, Esteban!

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Os Barcos

Você diz que tudo terminou
Você não quer mais o meu querer
Estamos medindo forças desiguais
Qualquer um pode ver
Que só terminou pra você

São só palavras teço, ensaio e cena
A cada ato enceno a diferença
Do que é amor ficou o seu retrato
A peça que interpreto,um improviso insensato
Essa saudade eu sei de cor
Sei o caminho dos barcos

E há muito estou alheio e quem me entende
Recebe o resto exato e tão pequeno
É dor, se há, tentava, já não tento
E ao transformar em dor o que é vaidade
E ao ter amor, se este é só orgulho
Eu faço da mentira, liberdade
E de qualquer quintal, faço cidade
E insisto que é virtude o que é entulho
Baldio é o meu terreno e meu alarde
Eu vejo você se apaixonando outra vez
Eu fico com a saudade e você com outro alguém

E você diz que tudo terminou
Mas qualquer um pode ver
Só terminou pra você

- Renato Russo

sexta-feira, 27 de maio de 2011

Varandas

Hoje mais uma vez sentei para olhar a rua e de novo senti frio. Como tem ventado na minha cidade, no outono seco de Maio, e como tenho me abstido de mim e dos meus papéis. Há um garoto que corre e me pede abrigo pra ver se não apanha do outro maior, mas me chamou de tia semana passada e eu decidi deixá-lo ali, no desespero de quem sabe a morte e ainda não tem tempo de emburrar com minha criancice. Acho que é por isso que não tenho estado ou escrito, porque estou com medo de nunca mais perdoar ninguém. A vida me tem feito crítica deliberadamente, sem saber que logo ela também se tornará pouco.
Não quero voltar à prosa falando nisso. Quero na verdade sumir enquanto caminho, sumir de frio e de velhice, e ficar só olhos e boca para falar das coisas bonitas que eu tenho no meu coração, ou até fazer meu coração sobrar sozinho e contar dos olhos dele o mundo lindo dessa praça. O menino apanha e chora, volta minguado, dou-lhe uma mão que ele segura sem o medo que eu tenho. Do toque, da praça, do tempo. Mas aproxima-se, faz tanto frio, e vai se apoiando porque quer colo. O grande problema com crianças é que acreditam que todo desconhecido que mede mais de um metro e meio é que nem o pai ou a mãe. Me dá uma vontade triste de dizer a ele que pai e mãe gostam da gente sem termos feito por merecer e que isso nos deixa mal acostumados, e que é por isso mesmo que todo pai e mãe depois que cresce pensa em morte, mas deixo estar porque faz frio.
Ele percebe que estou dura e sai andando. Gosto do carinho que ele me fez, mas não, não sou pra isso. Dá trabalho demais abrir-me às coisas que, segundo os outros, não me dizem respeito.
Levanto, sento por meia hora ou mais ao lado da minha senhorinha. Amo-a toda, mesmo que tenha morrido há uns três meses e só depois de cinco dias tenham dado falta por conta do fedor, mesmo que tenha de inventá-la como faço com esse eu-lírico tonto na história. Ela me conta que ainda chora quando vê passar um velho como o dela, metido em cachecóis e em calças de linho.
Conta que chora porque no além não pode tocar a música de saudade no acordeão. Me pergunta, sem perceber que me comovo, que sofro, que não aguento saber que a vida sobrevive, se os moradores da rua tem dado falta das manhãs de música que ela fazia. Minto que sim e ela se distrai com o banco descascado.
De súbito percebo que tudo o que vejo, ou foi bom e hoje morre, ou nasce no ponto de aprender mentiras. Vejo a casa onde morava minha infância e sonho com a morte da velhice, ainda na casa descascada, com botulismo talvez, acordando antes da rua para chama-la, sabendo coisas que ainda não sei. Sonho, porque o texto é meu e a tristeza minha, que vai nascer um córrego perto do meu jardim de folhas e que o frio vai me desprender dessa melancolia. Tenho medo das responsabilidades da idade adulta, medo de filhos, medo de pais, medo de frio, medo do agora e de não ter saudade do antes.
Chego enfim à árvore onde gravei meu nome quando beijei o primeiro dos primeiros, onde gravei meu nome e só, sem coração algum, sem flecha ou promessa de eternidade, sem nome de mais ninguém. Olho para o pingo no i tremido da menina que eu era e rio de lembrar que já naquela época fazia frio na rua. As pessoas tendem a esquecer dos pormenores e de inventar que o passado era excelente. Pois sim, fazia frio, hoje digo, hoje eu voltei a escrever. Fazia e ainda faz, e sento ao pé da sombra pra ver se abandono ali a culpa de não ter cumprido minha promessa de não esfriar também; pra ver se me lembro de algum sonho que remeta aos que existiram, mesmo tortos.
Desperto - estive dormindo. Tremo e levanto depressa e risco meu nome dali, mas o traço escorrega formando alguma outra palavra. O que é que não faz a vida, quando nos quer amaldiçoados? Me limpo dos galhos secos e me afasto, porque basta de viver, já é suficiente, posso voltar à toca. O menino vinha correndo já sorridente, mas me vê e desvia. Isso em combinação com o frio e com meu texto vago e trêmulo como o i na árvore me acalma. Estranho seria se eu, a essa altura, desse para perdoar alguém. Ainda mais por ousar ser feliz quando faz tanto, tanto frio.

sábado, 21 de maio de 2011

Sonha

Luxo de ímpar curiosidade
Ao desperto é coisa pífia
Por onde corre a efemeridade
do Amor ao romancista?

Apresento-lhe corrido espanto:
não é a dor e nem o pranto.
Malgrado devaneio de liberdade
Prender-me-ei mais tarde.


Transformo então em musical
onipresente enquanto aval
Caricatura da realidade
pouco esconde; meia-verdade.

Pois então o que me resta
se depois do meu canto
tudo é festa, orquestra
mas também meu acalanto?

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Desgaste

Disse com a mão no peito, em juramento
Que de tudo, àquele amor seria atento
E repetiu o sempre, o muito, e o tanto
Com um sorriso de contentamento.

Mas desgastou o canto dos lábios, tonto
Da finitude do tão honroso sentimento
Que ela cultivara sob o saudoso manto
A salvo das pragas e do relento.

E o eterno retumbou no aposento
Ouviu-se o sussurro de acalanto
Que deu por último, o amor (sem rima)

Que se morreu, então, n'um vão momento
Desencantou em face d'outro encanto
E desfez-se o riso solto em pranto.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Ruinas

Vai
Vai, mas guarde as cartas nos sapatos
Que tanto fiz para perder, debaixo da cama
E não consegui

Vai e enquanto ainda vai, 
tropece uma vez ou duas
faça feliz minha vaidade
em ver-te cambalear
Deixe eu pensar que é falta de mim

Vai e me arranque os dedos
Um por um 
Das costas dos seus braços finos
Me belisque se necessário
Pise no solado
Do sapato outra vez

Mas vai 
Vai como veio, solto
Ou como fica ainda encolhido
Na trincheira do meu portão
Que range e rosna, coçando
As suas pulgas e percevejos

Vai
E compre CDs melhores
Para suas próximas cônjuges
(não as chame assim)
Mas continue criando gírias 
E nunca deixa puberdade alguma te mudar a voz

Vai na chuva e sem correr
Faça o favor de evitar as curvas
Pra que eu sempre possa lembrar
De que você está me esquecendo


Vai porque o relógio desfiou os ponteiros
Pra dar logo a sua hora
E eu não sei costurar

Anda, vai, não se demore com despedidas
Não quero olhar no calendário
Que dia é hoje

Vai!
Não sei manter a postura
Caminho chutando latas
Procurando pedras
Enlameadas
Com marcas de sapatos
Que por pouco você não acha
Debaixo da cama
Cheia de quinas e restos de cartas.

terça-feira, 22 de março de 2011

Onda do rio

Eu nunca pensei bem sobre o nosso final, mas se ver por esse lado eu também não acreditava em cinema nacional.

Coisa mais bonita aquela lá
Do outro lado do rio
Um cárcere de palavras andantes.

Palavras sossegam enquanto nos falam
E palavras maltratam quem as dispense
Ou as desperdice.
Quem foi que as mal-disse?

De certo essas águas 
Afrontando os dicionários
Com suas onomatopéias.

Presas e ungidas.

Você, e você, de novo você, mas hoje só aqui... 
Se eu te tirar do papel te mato
Jamais maltrato.

Gostou de mim até onde as palavras alcançam
Meu bem, palavras não andam
Falam e estancam.

Ainda bem que onda de rio não me afoga.

quarta-feira, 9 de março de 2011

Canção de como o mundo é. . .

É que se esse mundo fosse
feito para ser doce,
fosse eu quem eu fosse,
acho que, doce eu seria. . .
O mundo é assim pra mim.
Vou parar de te querer assim,
tão pertinho de mim,
enquanto ainda não é dia.

Descansar de um coração. Ou dois

A noite não tarda a nascer e eu custo a entender. Durante certo tempo ficamos a esperar que florissem os ipês roxos. Esperamos tanto, lembra? E agora um ipê floriu. Só um único ipê em toda a rua. E eu já me cansei de não entender o porquê dessa estranha mania que a vida tem de me deixar longe de ti; de não entender porque esse ipê chegou tão atrasado ou tão apressado, esparramando flores pontudas pelo chão. Ele sabe que estou longe de ti? Ele está só esperando para que em baixo dele nos sentemos até o sol ir embora? Em todo mundo, só eu sei que teu coração anda cansado, pois assim anda o meu também. Cansado de não entender. Eu sei do teu coração. Eu e o ipê que vem florir em qualquer estação, para fazer descansar um coração. Ou dois.

segunda-feira, 7 de março de 2011

Mil passadas antes de dormir.

Olhou-se no espelho uma última vez naquela noite. O que restara? Espremeu os olhos, numa careta estranha. Ainda tinha as mesmas feições de que se lembrava. Os mesmos olhos cruéis, os mesmos lábios trincados. Talvez fosse isso, concluiu. Mesmo depois de todas as cambalhotas que sua vida dera, de todas as feridas que se abriram, ainda mantinha a mesma aparência. As cicatrizes estavam todas escondidas em algum ponto semi vital, que sempre fazia o corpo todo se retorcer ao toque de qualquer pensamento importante.
Aproximou ainda mais o rosto. Olhando bem, assim de perto, é que ela via algumas pequenas mudanças. Nada que pudesse ser notado, claro. Duvidava que se lembrassem de como era antes. Havia abaixo das sobrancelhas o mesmo olhar fulminante, mas podia ver uma camada extra de pele pesando ali. E as bolsas expostas, como se puxando sua vivacidade para a lixeira do banheiro, também eram novidade. Pensando bem, estava acabada. Seria a única no mundo a perceber isso?
Sentiu aquela coisa pinicante que todos sentem antes de chorar, como um impulso enorme de coçar os olhos quando se tem as mãos ocupadas. Mas manteve a altivez. Por cerca de dois minutos, tenho certeza, ela não ousou se mexer. Com medo de mais um instante sozinha com o próprio tempo, e com o próprio reflexo, pegou a escova de cabelo e penteou-os compulsivamente, com uma força desnecessária. Sentiu raiva ao ver o quão embaraçados estavam, e lançou-a para longe com toda a força.
Com as mãos tremendo, correu para o telefone. Discou um dos dois únicos números para os quais podia ligar, e cada segundo em silêncio parecia uma vida inteira.
Caixa de mensagens.
Xingando baixinho, foi à cozinha e virou dois copos d’água de uma só vez, como se fossem aliviá-la de quaisquer tormentos. Vagou pelos corredores da pequena casa como se não fossem acabar jamais, enquanto cantava uma música para ocupar a cabeça. Num flash de distração, se pegou pensando em que outra demonstração eles poderiam desejar para entender que não podia mais.

Ela entendia, ela via as forças, a coragem, tudo escorregando por entre suas mãos.
O que aconteceria depois que o estoque acabasse?
Sem ter a menor idéia de por quantas outras noite agüentaria lutar com os próprios pensamentos, tratou de reler um livro antigo pela qüinquagésima vez. Pelo menos haveria uma desculpa para seus soluços inconstantes.

sábado, 5 de março de 2011

Bilhete da aurora

O que há de mais paisagístico
Em debruçar-se nessas janelas que dão para o mundo
São, justamente, esses jardins orvalhados
Com suas flores origamis caleidoscópicas
Que parecem desabrochar
No momento em que acordas
Onde em tudo há um convite à vida!

sábado, 26 de fevereiro de 2011

Depois do dia

Que noite fria
E abafada, pertinente ao meu sossego
Se me vejo, não percebo o que sustente
Mas prometi?
Sou contingente
Vertente do aparente
Ai, que me corrompe esse caminho que tomamos
Não sei aonde
Ainda em frente?
Perdi sua mão e seus carinhos num só dia
Talvez em anos
Mas eu te amo
Te amei por mais verões que primaveras
Mais que essa gente
Só não tive os colhões de ser valente
A noite é fria, mas sou mesmo uma avarenta
Vivo no passo de alcançar o não-agora
Há quem aguente? 
Perdão, eu te pedi, eu prometi, eu fiz de novo...
Passei adiante as sementes que chorei
Só não passei
Não te esqueci
A noite aqui há de ser meu por enquanto
Mas eu te amo
Vou me deitar mais uma vez calada
Mais uma vez aquietar o meu pecado
Naquele quarto
Um eco estranho?
Me entranho
É que eu te amo.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

De fato..

Minha maior felicidade era te ter ao meu lado, adeus.

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Aquela estação

Escrevo-te porque já vivi
E se viveu, foi porque estive aqui
Me agarro ao que agora é vazio
No céu, teus olhos.. anil

Um abraço apertado, um beijo trocado
Dedos entrelaçados, um por-do-sol
Que enfim, silenciosamente ia apagando nossos planos

Na estrada silêncio, no peito noite;
Com um sorriso trago-lhe estrelas
Te amar amanhã, era o que mantinha de certeza

E naquela estação..
Um adeus.. suplicando.. perdão

Temo, porque já vivi
Vivo, porque já senti
De leve, mantenho a postura
Postura que se intitula errada;
Não sou tua cura.

E é incerto, sim, o que agora é certo
E mesmo que seja, brevemente que seja
Outro dia igual não chegará
E tais lembranças..
Esses dentro de mim jamais se esvairá.

- Enquanto o que eu acreditava se perdeu, eu sigo em frente estou de pé, ninguém pode tirar o que ja conquistei.. o medo renova a minha fé.



sábado, 19 de fevereiro de 2011

Hei de escrever-te um livro

Hoje hei de escrever um livro
E que trará o que sou e o que sei que sei
Mas cujas páginas de mais valor
Trarão impresso o sangue que não mencionei

Hoje hei de escrever um livro
Com mais cânticos que a própria escritura
Tanto usada por pobres como armadura
Quanto como prova de que a vida é dura
E que teve dias dos mais gentis

Obra essa, de primeira vã,
Certamente triste ao ponto de pagã
Mais triste fará sua ínfima autora
Se ao fim do ponto não se vangloriar pessoa
Tão rancorosa quanto não é o poeta

Comprada por quem o ler
Talvez lida por quem quiser fazer
E quem sabe achada, logo depois da ceia
Por alguém que pague uma vida inteira
Pelo pecado de por-lhe as mãos

E nessa obra escrita em folhas rotas
Hei de prender de mim o que for nuance
Esperas apenas mais algum romance?
Nunca será o que fui ou foi
Só um fantoche de meu próprio transe

Hei de escrever um livro
Saberei dizer, sucumbirá ao tempo
Não haverá repercussão dos séculos
Nem fortes ventos
Em seu auge vindos em seu favor

E ainda assim, com tamanho afinco
O farei despejo do que me foi vindo
O mundo acaba, não antes que nós,
- Em nossos versos lindos -
Ouçamos bradar mais uma vez um grito
Murmúrio pardo que farei ouvido

Pois esse livro
É mais que sentença
Há de ser tua culpa, e com tua licença
Minha libertação

Vou logo que saiba de minha tristeza
Soubeste ver em mim a realeza
Mas minhas feridas alçam maior vôo
Do que jamais tuas asas

E verás enfim o que de belo há em um tumor maligno
Já que a carcaça escassa do que me restar, o que de feio e pobre, como que em castigo
Hei de deixar que leve contigo.



Resposta

Te procuro nos lugares de sempre, porque meu corpo cansou de inventar outros. Tanto faz, não está aqui ou ali porque já não existe. Foi como a doença que alguma vez li e me fez rir, que vem, derruba e em si extingue. Mas fico em transe em ver então a sua sombra me olhar. Sombras tem olhos? Ambos sabemos que a sua sim. Fala comigo sem ouvir-me.

Ando em conversar só nos meus passos, ah! tinha uns meses que não chorava. Rodopia a tontura de teus sintomas, mas tudo é vulto. As proporções de viver não são as mesmas. Penso em perguntar porque hesitou. Quando foi que nos deixamos que não vi? Veio me chamar de Sol mais uma vez, porque a luz não reflete espectros. Perdeu um cado da viagem, mas nem o sinto.

Você de sombra com seus olhos só viu o que te conveio, deixou passar minhas tentativas. Talvez tenha pensado em mim, tenha ponderado umas duas vezes, mas teu passo nunca vacilou e por isso te sinto mágoa. Podia ter decolado logo. Sempre tão sensível, tão você que me impedi de ser eu, tão singelo. E eu altiva, de voz alta, um troglodita. Mãos rudes demais pra manusear uma estrela. Não tenho lugar a teu lado. Espero de pé - que é o que sou -alguém que eu possa levar sem medo de deixar cair. Alguém que me faça esquecer que não valho o papel em que escrevo. Alguém de pés no chão pra me acompanhar, ao invés das asas frágeis que eu nunca tive e que pensei poder roubar.

Enquanto espero, eu admito só bem dentro, bem baixinho: gosto de te ver voar. Desculpa se te segurei tanto tempo dentro do meu céu nublado.



Deixaste

Os braços já não são braços 
O corpo que não é teu
Me vejo em embaraços
Um ano e jamais tão fracos
Os laços do apogeu
Aquele que nos punha em fúria
Ruído sentido no mar
Do canto de baleias velhas
De marinheiros a se afogar
Deixaste-me, e deixaste triste
Um punho em riste
Punhado de coisa nenhuma
Foi meu porque fui tua
Meu amor não é falcatrua
Meu amor não é vulgar.

Deixaste-me, e deixaste triste
Pra trás
Nenhum olhar.



Monólogo frívolo sobre memórias.

Gosto tanto de gostar de ti
Assim, como somos nesse nosso encanto
E ainda assim, nada me espantaria
Acordar; próximo dia 
Gostando-te mais um tanto.

Pergunto-me se te faz feliz
Meu gostar assim, um gostar constante
E se gostas também de mim
Se só não diz
Ou passas adiante.

Gosto-te sempre bem mais que ontem
Podendo saber gostar-te menos
Dividir com teus sonhos meu bocado
Meu humilde apanhado
De sentimentos.

Ah, cá estou,
E tanta alma diz tanta besteira!
Gosto-te sim, e daí? Não me contento.
Não hei de o sentir, o contentamento
Nem te gostando a vida inteira.

Mas se me tocas a mão em relance
Ou se me vem como quem não esquece
Gosto-te, e isso me basta
Me deixa sem graça
Me enobrece.



Moça

Moça, minh'alma calou-se
Diante do mal que se ergue em azul
O mal não ser cinza, há quem negue
Mas não há olhar que carregue
Hoje o que em mim se calou.

Moça, há de ser provação?
Hão de ser as estrelas em vão?
Não mais hei de vê-las?
Hei de viver de cometas
Quando tudo em meu céu é constelação?

Moça, há explicação?
Meu corpo adentrou em fumaça!
E esse da mente disfarça
O que no coração ocorre.
- Refrato mil cores em lágrima -
Moça, será que isso passa?
Ou será que se morre?

Te digo, um mundo que cai
É um mundo que esteve em pé
Moça, se dói, bom sinal
Há um fundo no leito, e afinal
Há fundamento na fé.

Moça, meu peito sim, queima
Vi verde o pássaro e cantei à esperança
Fiz de um tropeço minha dança
E declamei em voz o que minto.

Mas o tempo há de ser o que teima
A alma, ser sempre criança
E os versos hão de fazer lembrança
A dor que deveras sinto.



...

Qual seria tamanha conexão entre ambas,o que me prende ainda entrelaçada em seus braços que faz esquecer-me de tudo em minha volta.O que seria essa dependência,essa necessidade de ter a presença,das duas partes assim por dizer.Tamanhas diferenças,que nos tornam quase completamente opostos,será então essa a razão,ou uma delas,na verdade também prefiro não saber.Definir saudade é tão difícil quanto guardar uma lembrança vaga que marcou esse tal presente que hoje nos faz sermos o que somos.Se minhas vontades são apenas pensamentos guardados,prefiro ter tua companhia e um copo de alguma bebida barata que me faça perder os sentidos em meio a sorrisos noite a dentro.


via : desvaneios